Novas pesquisas revelam as fragilidades e dificuldades de adaptação social dos superdotados
Pessoas de QI elevado sempre foram tratadas como um troféu familiar - está na hora, porém, de enxergar o outro lado.
Por: Paula Felix
Em: 09/08/2025
Celebra-se como troféu, no cinema, em séries de televisão e livros, a descoberta de uma criança ou adolescente superdotado - pessoas capazes de destrinchar equações intrincadas, soletrar longas palavras e elencar os países do mapa-múndi como quem soma dois e dois. Os geniozinhos, as mentes brilhantes, foram quase sempre tratados pelas famílias como dádiva, e aplaudir um QI alto, de 130 pontos para cima representaria ganhar na loteria. Pesquisas recentes, somadas a olhar mais cuidadoso, começam a reverter parte dessa percepção, e o que seria benesse pode vir a se transformar em desafio, ou mesmo fragilidade ou um problema.
Uma clássica pesquisa americana, o “estudo genético dos gênios”, como foi chamado, desses que acompanham os investigados ao longo de dezenas de anos, foi sempre a âncora para levar ao topo os muito inteligentes.
A partir da década de 1920, houve o acompanhamento de 1 521 crianças superdotadas. Na década de 1950, portanto trinta anos depois, dois terços delas haviam se formado na faculdade, número dez vezes maior do que a população em geral.
Em 1954, os homens do grupo que ocupavam cargos burocráticos em escritórios ganhavam, em média, 10 556 dólares por ano, valor exponencialmente superior aos cerca de 5 800 anuais de pares fora do espectro da genialidade. Sucessivos levantamentos, década após década, confirmaram aquele levantamento ancestral. Houve, contudo, mais recentemente, tropeções, com trabalhos que mostraram o óbvio: sensatez é a regra, e para cada resultado científico constatando a grandeza dos precoces há outro para desmenti-lo.
Em 2019, uma equipe de Nashville, nos Estados Unidos, analisou a trilha de 677 pessoas com destaque intelectual. Algo em torno de 12% tinham alcançado sucesso profissional aos 50 anos - o que significa dizer que 88% não chegaram lá. Um estudo de 2025 publicado no periódico Archives of Neuropsychiatry vai direto ao ponto: os superdotados correm mais risco de apresentar problemas de saúde mental, como depressão. E agora? A exuberância de competências cognitivas (de 5% a 10% da população mundial é dessa turma, a depender do rastreamento) pode ser um fardo.
O superdotado sente o peso de, invariavelmente, estar à frente da própria idade e acumular dilemas e reflexões próprios de uma maturidade que ainda não chegou. Chegar à fase adulta sem a compreensão desse estado também pode ser um nó, como recentemente se descobriu com o drama do humorista Whindersson Nunes, cuja internação por dependência de álcool terminaria por revelar suas altas habilidades. A falta de cuidado com elas é o que levaria ao desarranjo de agora? Evidentemente, não há como estabelecer associação direta entre o alcoolismo e os obstáculos de um QI superlativo, mas o tema foi posto à mesa - e, claro, viralizou nas redes sociais, a ágora onde tudo acontece. “As pessoas nascem com essa predisposição. Em interação com o ambiente, sendo estimuladas e orientadas, têm condições de desenvolver algum potencial”, diz a psicóloga Denise Arantes-Brero, diretora do Núcleo Paulista de Atenção à Superdotação.
O nome do jogo é compreensão associada a carinho, e nada de sair festejando, por festejar, um QI extraclasse.
Publicado na Revista Veja em 09/08/2025
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